Tens para a troca...?
Gostaria de te dizer uma palavra que não sei. Uma palavra que não conheço. Mas é essa, precisamente essa, que preciso de te dizer.
Tal como no dia em que quis sorrir e não pude pois não sabia como se fazia para sorrir. Sobretudo para sorrir a alguém. Não podia dar o que não tinha. Por mais que procurasse a fonte idealisticamente inesgotável. O poço secara... Aliás, desde sempre tivera sido um poço seco, tal e qual ventre estéril e desprovido de vida. Como a mãe que abre o colo em busca da semente que não tem, que não gera vida, que não basta querer semear. Assim como viver todos os dias e encontrar a impossibilidade a cada esquina.
O meu sorriso só pode ser a ausência de sorriso, já que espelho de todos os que me são esboçados diariamente, que são nenhuns. Tento encontrar nos confins da memória o esgar da felicidade, mas as rugas da mente fazem esquecer. Quero esquecer. Na verdade não quero encontrar. O que faria face a tão ilustre desconhecido? Aquele de que todos falam, mas poucos o fazem realmente. Recordo alguns traços do que me parece corresponder ao que descrevem como"sorriso", mas o afecto presente não é aquele de que falam. Recordo azedume, ironia, intriga, e ainda a cor amarela... não o amarelo vivo, mas o amarelo desvanecido, cor de vómito... Não recordo a alegria de que dizem o sorriso ser expressão...
Estou cansada de esperar que me sorriam. Para que possa fazer o mesmo, para que possa retribuir. Contudo, hoje vou fazer algo diferente. Não vou esperar. Vou pensar na primeira pessoa que sorriu no mundo e mais do que reproduzir ou retribuir, vou criar e oferecer. Faço um esforço agora... as linhas do rosto alteram-se, os músculos faciais empurram-se uns contra os outros e oferecem-se a um esforço desconhecido. Um esgar e uma sensação diferente encontram lugar no meu rosto. Sinto algum prazer, agora já não é só esforço. Estou a gostar... mas agora... que fazer com esse prazer...? Acho que sorri... será que alguém percebeu?
"Mona Lisa", L. DaVinci