quarta-feira, julho 26, 2006

Ritmos



Há quanto tempo não ouvia a música. E agora soltava-se por entre os cabelos e sentia as notas cravadas no coração aberto. Não o coração aberto metafórico, mas sim o coração aberto visceral. Com muito sangue e pausas de dor. Por isso é que as pausas têm tempo. Por se poderem transformar numa solidão interior, num eterno e ritmado dilacerar da carne rasgada.

Dantes a música ía e vinha... ía e vinha... Até que um dia foi, e o caminho enrolou-se atrás da última pegada. Agora não era um mero ondular, não era suave. A música chegava violentamente, atacando o corpo despido de qualquer defesa, que a cada nota, a cada som, a cada timbre, se entregava, sem se importar em saber qual seria o toque final. E o toque final não vinha. E o corpo quase terminava antes da música, em luta com o ritmo, em cópula com a vibração do som.

A música chegava agora de modo insuportável. Sobrepunha-se aos gritos mudos. Até que agarrou a cabeça com força, rodou sobre si mesmo em esgar de dor, e arrancou, finalmente as orelhas.