Eterno Retorno
A manhã sacode-me para fora do sonho, estremecida.
Momentos antes vivera-se o grande dilema:
Os pais estão perto dela e ajudam-na na sua decisão. Numa sala de hospital, está preparada para a grande operação. Soubera que, por razões a decifrar, dificilmente sobreviveria se não a fizésse. A única maneira de ser salva seria esta intervenção que a devolveria ao início dos inícios - o retorno ao colo da mãe. Uma intervenção clínica tornaria o seu tamanho adequado a passar nove meses no útero materno, permitindo-se nascer outra vez.
Sente-se um súbito nervosismo no ar. Há uma hesitação presente. A angústia. Tem de saber o que acontece depois...
Depois? Depois, dizem os médicos, após o nascimento não se lembrará de nada. Assim como todas as pessoas que nascem não se recordam da sua vida anterior.
Era um pouco como a morte, pensou para si, sentindo um peso maior no peito. Já em lágrimas, pediu aos pais que a relembrassem quando nascesse. Contudo, rapidamente concluíu que esta situação, mesmo contada pelos pais quando tivésse idade para compreender, apareceria aos seus olhos como um facto disparatado, absolutamente inverosímil. E ela tinha que saber. Ela tinha que se lembrar.
A mãe, já de bata, preparava-se para a receber de novo. Uma dádiva que a poucos seria concedida.
No entanto, a angústia cresceu a limites desmesurados quando compreendeu, enfim, que, para além da hipótese ainda que remota de não conseguir nascer, e morrer no processo, nunca seria a mesma pessoa. De facto, seria criada de modo diferente, num espaço diferente, num tempo diferente. Nunca seria ela própria. E pior: nunca poderia recordar como fora. Contudo... quereria fazê-lo?
A dúvida. A incerteza. A ambivalência. Nascer ou morrer, ficar ou partir. Arriscar?
A verdade é que este renascimento, este agradável recolher ao morno colo materno, lhe parecia, ao mesmo tempo, uma morte.
Desperto onde as lágrimas não chegam.

"Woman Reborn", Kay Ekwall