quarta-feira, janeiro 18, 2006

Branco sobre Branco

O corpo, curvo e sem pele, permanece sentado. Imerso na alvura que consome, no branco insistente. Talvez infinito. Ou ainda cheio de nada. O branco pode ser insistente. É assim a dor. Branca.
Os pés não têm asas, as que pediu outrora emprestadas há muito se foram, incrédulas, desiludidas e desrespeitantes.
O tempo consome o branco. E o branco consome o tempo. A dor é como o sempre tempo presente. Nunca passa, ao mesmo tempo que já passou.
Penso no que restará quando terminar o processo mútuofágico. O tempo pára quando se inventam palavras. Mas não o suficiente.
Passado o tempo infindável, o branco torna-se então cada vez menos branco, apesar da luz ser a mesma e o espaço ser identicamente o mesmo. A tonalidade escurece.
Talvez seja a figura curva e em carne viva, ensaguentada, que não é a mesma. As órbitas onde outrora moraram olhos, já não são as mesmas. Os sentidos não são os mesmos e então podem enfim captar uma superfície menos alva através da podridão interna que tolda os sentidos e os torna sempre mais turvos.
Por momentos há também o azul. E tudo se torna azul e frio. Até o branco se tornou azul.
O corpo sem pele é consumido pelo frio. Pelo branco. Pelo frio. Pelo branco. Pelo frio...



"Whiteness in Decay", Regina Frank




domingo, janeiro 08, 2006

Domingo(s)
A manhã era clara e lânguida. Clara e silenciosa, como só a manhã de Domingo. Salvo imprevistos acontecimentos, as manhãs de Domingo são sempre assim.
Amarela de sol, quieta e amena, apesar do frio de Janeiro. Como o gato espreguiçante que se oferece ao sol e com ele se deixa ficar num misto de ternura e de preguiça.
Era bom passar as mãos pelo cabelo, como se cada gesto não constituísse um antes ou um depois... Os ramos das árvores, pela janela, eram como dedos longos e curvilíneos de uma velha. Parados, mas significantes. Nada faria lembrar que o tempo existe na manhã de Domingo. Como se soubesse que nunca acabaria, que o tempo fosse perene e para sempre existisse continuamente o presente. Nao é preciso respirar fundo para se saber que se está vivo. As imagens entram pelos olhos como sonhos ainda por sonhar e as cores desvanecem-se e esbatem-se como num quadro impressionista. Assim se vive o sonho ao Domingo.
Só daqui a pouco, o tempo começará a correr...
Feliz Ano.
"Sunny Sunday", Zondag